Coluna Pomerana
Um casamennto perfeito Pulteråwend (Polterabend) e Swartsuur (Schwarzsauer)
Publicado em 18/05/2020 às 20:38
As vilas formadas pelos descendentes pomeranos, nos diversos distritos de Pomerode, sempre surgiram apoiadas em três pilares: a igreja (fé), a escola (ensino) e o local para o entretenimento (diversão). A vocação para o trabalho sempre permeou todos esses pilares tendo sido a base dessa tríade. No âmbito do entretenimento, as festas, como casamentos e bailes aconteciam nas casas das famílias (Hausball), pois na formação da vila a prioridade era construir a escola e a igreja. Mais tarde surgiram os clubes sociais denominados de Schützenverein.
Nas primeiras décadas da imigração, as festas no interior sempre foram regadas com aguardente (Schnaps) e licores (a cerveja somente foi incorporada mais tarde). A alimentação, com seus diversos pratos, era elaborada com produtos da colônia. O casamento na comunidade está entre os festejos mais celebrados e os preparativos por si só já são um evento. Quando se pensava em um casamento, o planejamento começava meses antes e geralmente um porco e aves extras eram especialmente criados para essa festa. Também havia o hábito dos convidados presentearem os noivos com uma galinha, um pato ou um ganso.
Cercado de rituais, o casamento geralmente acontecia na casa dos pais da noiva e como boa parte das aves era abatida na sexta feira (um dia antes do casamento), de noite servia-se um jantar para os vizinhos e demais, que auxiliaram nos preparativos. Chamada de noite do “Quebra Caco” (Polterabend, em alemão e Pulteråwend, em Pomerano), pois nessa noite, várias peças de porcelana costumavam ser quebradas no local onde seria a festa. Fala-se que a tradição secular mandava guardar toda a louça quebrada, no dia a dia, nas casas das famílias, para que pudesse se utilizada nas noites de quebra-caco de futuros casamentos. Dessa forma, também os convidados, nessa noite, levavam como “presente” as louças quebradas e, ao entregá-las, as deixavam cair no solo, para assim aumentar a quantidade de cacos.
Ao mesmo tempo, os noivos com uma vassoura, deveriam recolher os cacos, enquanto os convidados novamente voltavam a espalhá-los pelo salão. Esse ritual acontecia em um ambiente de grande alegria e descontração. Diziam que, os cacos espalhados pelos convidados e repetidamente recolheidos pelos noivos, estimulariam os noivos a trabalharem juntos.
A tradição do “quebra caco” era muito viva no norte da Alemanha e sua manifestação ocorre até os dias atuais, trazia a despedida dos solteiros como principal objetivo. Ocorria também na Polônia, na Áustria, na Suíça e em países escandinavos como Dinamarca e Finlândia. A historiadora de cultura popular Annette Remberg destaca que o costume teve início por volta do século XVI e há registros que podem ser encontrados no findar da Idade Média. No final do século XVII era denominado de “Polternacht”. O dicionário Grimm (Grimms Wörterbuch) descreve o Polterabend/Pulteråwend no século XIX como a véspera dos casamentos comemorada com banquetes, dança e todo tipo de piada/poesia.
O costume de quebrar porcelana se baseia no ditado popular “Scherben bringen Glück” (cacos trazem sorte). Os sociólogos Peter von Haselberg e Heinz Abels destacam que é um ritual de ofertamento. Helmar R. Rölke, em seu livro “Descobrindo Raízes”, refere que na Pomerânia, o Polterabend/Pulteråwend remonta do período anterior à cristianização.
Quebrava-se louças de porcelana e cerâmica e batia-se panelas para afugentar os maus espíritos que eventualmente pudessem atrapalhar a vida matrimonial. Havia um ritual que se resumia assim: “dentro da sala, atrás de uma mesa, sentavam-se os noivos.
As irmãs ou parentes próximos, recitavam versos denominados de Kranzgedichte (poemas de grinalda). Seguiam-se brincadeiras históricas cômicas da vida dos noivos. Durante essa brincadeira, no externo da casa iniciava a quebra das louças acompanhada de muito barulho (batidas de panelas). As louças eram jogadas contra a porta da casa para que fosse aberta, e a festa seguia dentro de casa com muita comida e bebida. Até a manhã do casamento os noivos eram responsáveis pela limpeza dos cacos, e estes deviam ser enterrados no entorno da casa e na lavoura”.
Os rituais são profundamente enraizados na cultura germânica (como em inúmeras outras culturas). Clarice Ehmke no texto “Testo Salto: Casamento das décadas de 50 e 60” destaca um interessante relato sobre os casamentos no Vale do Itajaí e como era um dos eventos mais esperado: “Esses encontros de amigos e familiares consistiam em banquetes intermináveis, com música animada a noite toda. A data da festa era precedida pela celebração do Polterabend, noite do barulho ou quebra-caco, como se fosse uma despedida de solteiro. No dia que antecedia o casamento, todos os conhecidos, convidados ou não, apareciam na casa da noiva, ou clube, declamando poesias e entregando presentes. Entre os “mimos” oferecidos havia sempre algumas galinhas, patos e marrecos que deveriam engordar o banquete do dia seguinte
Os presentes mais tradicionais eram bacias ou caixas com louças quebradas que antes de serem entregues ao casal, eram displicentemente jogadas no chão.As pessoas traziam consigo pacotes e caixas devidamente embrulhados. E de tempo em tempo, os convidados ao se apresentarem para felicitar os nubentes e entregar o presente, deixavam-no cair, com ar desastrado.
Os noivos tinham que varrer os cacos para deixar o espaço limpo. Tudo limpo, um “distraído” chutava tudo de volta para o meio do salão, e os noivos novamente varriam tudo. Acreditava-se que os cacos resultavam em sorte.
O cardápio desta celebração era sopa de cabidela, ou Schwarzsauer, considerado pelos moradores das regiões rurais um prato requintado para datas especiais. O dia que antecedia a cerimônia do enlace, quase sempre a sexta-feira, era marcado por muito trabalho. Geralmente as mulheres da família e até vizinhos reuniam-se no preparo dos alimentos que seriam oferecidos durante a festa. No tão esperado dia do casamento, o cartório era o primeiro destino dos noivos. Se a cerimônia fosse numa igreja afastada do centro, era necessário antes parar no fotógrafo para registrar o acontecimento.
Depois, após um rápido lanche (Frühstück) seguiam para a igreja. No ato do casamento, numa caixa de madeira com fundo falso (Hochzeitskiste) mandada fazer dias antes, cada um dos noivos colocava dentro da caixa, um bilhete. Também o buquê de flores da noiva era colocado nessa caixa, para depois ser vedada com uma tampa de vidro.
Somente com a morte de um dos noivos a caixa podia ser reaberta, para então, o viúvo ou a viúva saber o que seu par havia deixado escrito. No percurso para a festa, os padrinhos aproveitavam e compravam litros de licor e bebidas destiladas, para serem servidas como aperitivos na entrada da festa. Enfeitadas com fitas coloridas, as bebidas eram oferecidas aos convidados, na hora dos cumprimentos, durante a recepção e consumidas das próprias garrafas.