Coluna Pomerana
O que outrora movimentou uma economia
Publicado em 05/04/2023 às 09:07
Folha Pomerana Express | Um Informativo à disposição da Comunidade Pomerana Brasileira
Franz Lerchenmüller
Correspondência Cultural da Europa Oriental n.º 1433
Janeiro de 2023
Tradução Ivan Seibel
Um verdadeiro Eldorado da Europa outrora se localizava no coração da atual Eslováquia. Ouro, prata, cobre e ferro eram encontrados nas montanhas ao redor de Banská Štiavnica, Kremnica e Banská Bystrica. A partir do século 13, tudo isso passou a atrair mais e mais mineiros alemães. Dessa forma eles passaram a desempenhar um importante papel no desenvolvimento da moderna mineração em todo o mundo.
Agora imaginemos que, em um dia de um calor intenso, um pastor de ovelhas tenha deixado suas ovelhas pastarem por algumas horas na encosta da montanha de Glanzberg e que, lá pelas tantos tenha conduzido o rebanho para uma encosta mais elevada.
Conta a lenda que há muitos e muitos anos, este fato realmente teria acontecido, pois, ao se deparar com uma rocha refletindo uma intensa luz em seus olhos, teria ficado espantado. Teria sido um estranho brilho, como que brotando do chão! Ao se aproximar, cuidadosamente, observou dois esquilos em uma área ensolarada. As costas de um brilhava como ouro, enquanto o outro ostentava um brilho prateado. Ao se aproximar deles, ambos se esconderam debaixo da pedra. Ao remover a pedra para o lado, surpreso, emitiu um assobio: a rocha estava riscada de veios de prata, com pequenos grãos dourados e com muito brilho.
O nome desse afortunado descobridor era Sebenitz e, muitos anos mais tarde, em sua homenagem, por gratidão, a cidade, que nesse meio tempo tinha surgido neste lugar, foi chamada de Schemnitz.
Conta-se que teria sido dessa forma que se iniciara a mineração nas montanhas de Kremnitz e Schemnitz. Na verdade, a mineração deve ter começado há muitos milênios. Existem achados que mostram que aqui, já na Idade do Bronze, teriam sido feito escavações na procura por bronze e que, nos rios, até mesmo os celtas teriam procurado por ouro.
A região, em torno das cidades de Schemnitz / Banská Stiavnica, Kremnitz / Kremnica e Neusohl / Banská Bystrica, que até depois da Primeira Guerra Mundial fazia parte da Alta Hungria, se caracterizava por sua paisagem de aspecto suave e idílica. Hoje, parece parado no tempo e esquecida pelo mundo. É inimaginável que outrora, na Idade Média tinha se transformar em algo como um Eldorado da Europa. Fornecia matéria prima para sustentar a economia, que enchia os baús de dinheiro dos comerciantes. Aqui foram extraídos ouro, prata, cobre e ferro.
Já em 1156, um bispo escreveu sobre essa terra dos mineiros, que chamou de “terra banensium”. Mas, apenas a partir da década de 1930, os vilarejos de fala alemã em torno dessas minas, passaram a ser conhecidas como “Hauerland« ou Deutschproben / Nitrianske Pravno e Kremnitz.
No entanto, ao longo da história, rapidamente, as riquezas mais próximas da superfície foram se esgotaram. Por isso, para não interromper o fluxo de toda essa riqueza, fez-se necessário trazer um know-how técnico de fora. Mineiros na Saxônia, Baviera e Tirol já tinham maior conhecimento sobre mineração e foi para eles que, no século 13, os reis húngaros se voltaram. Naturalmente, para atrair “especialistas” de comprovado conhecimento para essa região desconhecida (atual República da Eslováquia), foi preciso oferecer-lhes muitos benefícios. Não foi apenas lhes oferecido uma área de terra e a permissão para construir suas próprias casas, mas também a oportunidade de tomar cerveja (algo inimaginável naqueles tempos). Receberam algo ainda mais importante: podiam ter as suas próprias leis.
O recrutamento teve sua compensação. Os “especialistas” receberam treinamento, fazendo com que aprendessem a distinguir veios promissores de rochas improdutivas. Eles sabiam como construir poços e túneis seguros e sabiam como trazer a necessária água, de longas distâncias, até as minas. Já bem mais tarde, no início do século 18, o matemático Mathias Cornelius Höll chegou a desenvolver uma bomba de água especial. Seu colega húngaro Sámuel Mikoviny projetou um sistema de tubos e canais. Em torno de Schemnitz foi criada toda uma rede de reservatórios interligados, sendo que, hoje ainda existem 42 dos outrora 60 reservatórios de água, e que hoje formam um atraente roteiro para caminhadas.
Desde o século 13 as leis da mineração eram escritas em alemão e muitas palavras foram assimiladas pela língua eslovaca e preservadas até hoje. Assim, »Sachta« significa eixo, »Stólna« significa um túnel e »Pumpa« nada mais é do que uma bomba.
Toda a região apresentava uma característica, que de certa forma lhe foi benéfica. Essa vantagem residia no fato de alguns minérios serem encontrados em maior quantidade em determinadas áreas. Assim, por exemplo, Kremnitz em função da sua riqueza em ouro, passou a ser conhecida como “Cremnitz dourada” e Schemnitz como “Schemnitz prateada” e Neusohl de “Neusohl cobreado”, nomes esses, que se mantiveram até os dias atuais.
Calcula-se que, por volta do ano 1400, um terço de todo o ouro e prata extraídos em todo o mundo tenha saído daquela região. Em 1494, os habitantes de Augsburg, cientes de que se tratava de um bom negócio, se associaram a um comerciante e engenheiro de minas da Cracóvia, chamado Johann I. Thurzo. Isso resultou na vinda de uma avançada tecnologia. Os suábios contri- buíram com um importante capital financeiro, o que fez com que esse empreendimento resultasse na construção de grandes instalações de beneficiamento de cobre em torno de Neusohl e que logo também tivessem o monopólio do comércio desse metal. Com o passar dos anos se iniciou a falar que “O Augsburgo dourado repousa sobre o cobre de Neusohl”.
Thurzo, em função da riqueza acumulada, também expandiu o seu próprio banco por toda Europa e, ainda hoje, o grande número de agências bancárias que ainda existem na cidade de Neusohl remontam dessa época. A própria Casa Thurzo, ainda existente até os dias atuais, relembra esse pioneiro.
Na medida em que as barras de ouro e a prata vinham sendo fundidas, eram transportadas para Kremnitz. Em 1329 começaram a ser cunhadas as primeiras moedas. Eram as “Florenças”, como inicialmente eram chamadas. Mais tarde passaram a ser chamados de “Ducats”. Nos séculos 14 e 15, eram muito procurados em toda a Europa. Também a imperatriz Maria Teresa teve muitos de seus famosos thalers produzidos aqui – mais do que todas as outras moedas do Império Habsburgo combinadas.
O subsolo rochoso de muitas cidades do centro da Eslováquia, com seus muitos antigos túneis, são testemunhos visíveis da milenar história da mineração. Assim, por exemplo, Hodritsch / Hodrusa é um dos assentamentos típicos de mineiros, construídos no século 16. O seu túnel “Todos os Santos” foi preparado para que os visitantes possam nele entrar com uma lâmpada de mineiro no capacete e contemplar seus 700 anos de história. Os vestígios dos cinzéis na rocha são claramente identificaveis, com os quais gerações após gerações ampliaram os seus longos corredores.
Em 8 de fevereiro de 1627, Kaspar Weindl, um mineiro do Tirol, conseguiu realizar a primeira explosão em uma mina, com pólvora. A demolição funcionou e, de lá para cá, tornou o trabalho muito mais fácil. O novo método se espalhou pela Alemanha, Inglaterra, Suécia e assim, pelo mundo afora.
Porém, com o passar do anos, o rendimento das minas foi ficando cada vez menor, fazendo com que as escavações também precisassem ser cada vez mais profundas exigindo a utilização de técnicas mais aprimoradas. Isso fez com que, ao longo dos séculos, o sistema de coleta rudimentar, utilizada nos primórdios, em minas cada vez mais profundas, fosse substituído por técnicas sofisticadas. Em 1735 foi fundado uma escola de mineração em Schemnitz. Em 1762, a imperatriz Maria Teresa a transformou em uma verdadeira academia de mineração. Assim, por assim dizer, teve o início a indústria de mineração moderna e científica.
Ainda hoje encontramos vestígios da antiga riqueza da cidade. Da torre da Igreja de Santa Catarina a vista vai para a praça principal, um prado inclinado, dividido por caminhos retos e fileiras de árvores. Na Coluna da Trindade barroca, construída no século 18 para homenagear as vítimas de uma epidemia de peste, podem ser observados mais de sessenta santos, anjos e apóstolos.
Dizia-se, “Man hatte das Geld dafür und man zeigte es auch. Der Glanz von damals ist verblichen. Aber vom Abglanz zehrt man bis heute”. Ou seja, para isso tínhamos o dinheiro e também o mostrávamos. O brilho daquele tempo se desvaneceu. Mas o seu reflexo persiste até hoje.
Há alguns anos, em uma tentativa de manter viva a história daqueles alemães, a Associação Alemã dos Cárpatos na Eslováquia, iniciou um projeto de teatro de marionetes para escolas, conhecido como “Blaufuss” (traduzindo: pés azuis”). Nele, o personagem eslovaco Gaspar, junto com os pioneiros alemães Mestre Hämmerlein, Hanswurst e Kasperle, passam a viver suas inúmeras aventuras na antiga Hauerland. Também no jornal da Associação dos Cárpatos, ocasionalmente, divulga temas relacionados aos mineiros.