Especialistas alertam para diabetes em crianças
Publicado em 11/11/2022 às 14:49
Foto: Canva
Nesta segunda-feira (14), celebra-se o Dia Mundial do Diabetes, uma doença que vem registrando aumento de incidência no últimos anos. Fabiana Lorencette vive a realidade da doença de perto. Suas filhas Renata, 21 anos, e Hana, 14, são dependentes de insulina e a doença foi descoberta quando eram crianças. Para a mãe, foi um susto: “A Renata tinha 6 anos e vinha tendo quadros de gastroenterites. Foi internada algumas vezes, mas nenhum pediatra pedia exame de glicose. Eu vinha observando que Renata constantemente ficava muito desanimada, sem vontade de fazer nada, não queria comer direito, cansava muito rápido, fazia muito xixi, engordou muito e depois emagreceu muito”, recorda Fabiana.
Um dia, a menina piorou e a mãe a levou ao hospital, onde precisou de balão de oxigênio e sonda para urinar: “A enfermeira ficou preocupada pela Renata ter tomado muitos litros de soro e estar desidratada. Quando a pediatra mediu, o aparelho deu PIN (significa uma hiperglicemia que o aparelho nem indica mais, acima de 600).” Segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes, o diagnóstico é dado se, em jejum, a glicemia estiver acima de 126 miligramas por decilitro (mg/dl).
Renata precisou ir para a UTI Pediátrica, pois estava em coma cetoacidose. “Na hora, em 5 minutos, fui saber o que era diabetes, coma cetoacidose e que ela estava entre a vida e a morte. Foram feitos todos os exames que precisasse e fechado o diagnóstico de DM1 (diabetes tipo 1). Ela já começou a tomar a insulina ali”, conta a mãe.
A demora no diagnóstico colocou a vida da pequena Renata em risco: “Foi explicado que a DM1 já vinha na genética e ela já podia vir apresentando sinais e não foi diagnosticado. Esses quadros de gastroenterites provavelmente eram os sinais. Na última internação, a dose excessiva de soro glicosado quase a matou”, relata Fabiana.
Doença crônica
O diabetes é uma doença crônica, muitas vezes silenciosa, na qual o corpo não produz insulina ou não consegue empregar adequadamente a insulina que produz. “Isso determina a elevação dos níveis de glicose no sangue”, esclarece a endocrinologista e presidente da Sociedade Brasileira de Diabetes Regional ES, Juliana de Paula Peixoto.
O problema assusta no Brasil. Segundo o 10º Atlas da Federação Internacional da Diabetes, publicado em 2021, o país ocupa o 3º do ranking mundial de diabetes tipo 1 em crianças e adolescentes (0 a 19 anos), perdendo apenas para os EUA e a Índia.
O tipo 1 é uma doença autoimune. A endocrinopediatra Christina Cruz Hegner destaca que, apesar de haver um fator genético determinante, a síndrome metabólica não é hereditária e pouco tem a ver com as questões ambientais no que diz respeito à prevenção:
“As crianças já nascem com essa predisposição genética e a gente tem um gatilho que muitas vezes tem relação com um vírus, algo que dispara o sistema imunológico contra as células beta do pâncreas. Na pandemia, tivemos muitos casos de diabetes tipo 1 desencadeados pelo próprio vírus.”
Christina Hegner aponta ainda que questões emocionais também podem desencadear esse processo. “Perdas importantes na família, crianças que tenham sofrido problemas emocionais, podem ser gatilhos.”
Incidência
O diabetes tipo 1 concentra entre 5 e 10% do total de pessoas com a doença e não tem cura, apenas controle. Já o tipo 2, que responde por 90% dos casos, manifesta-se mais frequentemente em adultos, mas crianças também podem apresentar. “Esse tipo surge geralmente associado à obesidade, quando em decorrência de resistência insulínica, o organismo não consegue usar adequadamente a insulina que produz. Por isso, o diabetes tipo 2 pode acometer crianças e adolescentes”, alerta Juliana de Paula.
Estudo conduzido pelo Centro de Pesquisa Biomédica Pennigton, em Louisiana, nos Estados Unidos, constatou que o isolamento social imposto pela pandemia fez com que crianças e adolescentes ficassem mais sedentárias e comessem mais alimentos processados. O resultado foi um aumento nos casos de diabetes tipo 2 entre os pequenos. Em 2019, a taxa de hospitalização em decorrência do diabetes foi de 0,27%. Em 2020, o número saltou para 0,62%.
No Espírito Santo, 723 crianças e adolescentes foram internados por diabetes (tipos 1 e 2) desde 2017. O dado é da Secretaria de Estado de Saúde (Sesa/ES).
Sintomas
De acordo com o Ministério da Saúde, os pais devem ficar atentos à fome frequente, sede constante e vontade de urinar diversas vezes ao dia, sintomas comuns aos dois tipos de diabetes. No diabetes tipo 1, é comum a perda de peso, fraqueza, fadiga, mudanças de humor, além de náuseas e vômito. Já na tipo 2, observa-se o formigamento nos pés e mãos, infecções frequentes na bexiga, rins e pele; feridas que demoram para cicatrizar e visão embaçada.
Anos depois do diagnóstico de Renata, Fabiana reviveu a experiência, dessa vez mais munida de informações. “Com a Hana, foi um pouco menos assustador. Ela tinha 4 anos, Chegamos da escola e fui dar banho na irmã gêmea dela, a Beatriz. Passei pela Hana e a vi toda encolhida em um pufe na sala e sentindo frio. Ali parei e olhei pra ela, fui tocar ela pra ver se estava quente de febre e ela me olhou tão profundo. Intuição de mãe. Medi a glicose da Hana e deu 396. Com base no que usava de insulina na Renata, sabia quanto aplicar na Hana. Apliquei a ultrarrápida enquanto ligava para o pediatra”.
Hana estava fora de perigo, mas precisou ficar internada por 15 dias. “Um filme passou na minha cabeça, desde a época da Renata e vendo tudo aquilo acontecer com a Hana e como consegui agir tão rápido com ela. Foi muito útil ter me interessado e estudado sobre o diabetes. Fez muita diferença”, ressalta Fabiana.
Já Claudineia Rosa Benfica, mãe de Isabella, 9 anos, descobriu que a filha tinha diabetes tipo 1 em 2017, quando a menina começou a pedir para beber água a todo momento:
“A princípio, eu estranhei porque ela bebia pouca água. Ela também começou a não aguentar chegar ao banheiro e começou a urinar na roupa. Fiquei preocupada, pois ela já tinha total autonomia com suas necessidades fisiológicas. Dias depois, ela começou a apresentar fraqueza, só queria colo, não tinha ânimo para fazer nada. Foi então que a levamos à farmácia para teste de glicemia. Para nossa surpresa, estava em 450 mg/dl.” Prevenção
Como a diabetes tipo 1 é uma doença genética, não há que se falar em prevenção. Já a diabetes tipo 2, por estar associada à obesidade, pode ser evitada com uma nutrição adequada. “(Alimentação) rica em fibras, com menos produtos industrializados e bebidas açucaradas; associado ao estímulo à prática regular de exercícios, com redução do tempo sedentário (sobretudo diante das telas)”, orienta Juliana Peixoto.
Tratamento
O tratamento varia conforme o diagnóstico. O diabetes tipo 1 requer insulinização e monitorização da glicose capilar para tratamento eficaz.
Fabiana, mãe de Renata e Hana, recorreu ao SUS para conseguir as insulinas e insumos pela Farmácia Cidadã. “Mas os atendimentos de consulta são pelo plano de saúde”, destaca a mãe. As duas realizam acompanhamento médico regular, com medicamentos diários e consultas e exames periódicos. Mas o controle da doença não vem só da medicação. Após o diagnóstico de Hana, “a alimentação que já era boa, precisou ainda passar por alterações”, afirma a mãe.
Pela rede pública o Hospital das Clínicas, em Maruípe, Vitória, tem estrutura de atendimento ao público infanto-juvenil. “Eu trabalho no Hospital das Clínicas, onde temos um serviço de atendimento às crianças diabéticas tipo 1. Temos um cadastro com mais de 150 pacientes. Eles são acompanhados por uma equipe multidisciplinar com endocrinopediatra, enfermeira, nutricionista e assistente social. Temos um ambulatório só de bomba de insulina, que é uma terapia de ponta para o tratamento da doença”, descreve a médica Christina Hegner.
Segundo Claudineia Benfica, a pequena Isabela, paciente de Christina Hegner, já está acostumada a lidar com seu tratamento. “Ela usa hoje o sistema de infusão contínua de insulina. É um dispositivo pequeno, computadorizado, que injeta insulina continuamente e ajuda a monitorar nível de glicose.”
O diabetes tipo 2 envolve uma abordagem para controle de excesso de peso e uso de medicamentos para controle de glicose aprovados na faixa etária em questão.
Onde buscar ajuda
De acordo com a Sesa, o usuário deve procurar a unidade de saúde do seu município, onde pode ter atendimento de nutricionista/médico e, se necessário, ser encaminhado para atendimento especializado.
Fonte: Assembleia Legislativa ES