Coluna Pomerana
A TERRA DOS ANCESTRAIS POMERANOS – Parte I
Publicado em 18/03/2022 às 09:31
Genemir Raduenz, Edson Klemann, Johan Strelow, Cláudio Werling
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Falar sobre uma província, ou como para muitos, uma nação que não mais existe, traz um desafio inerente, de criar identidade com um local praticamente ocupado por outra cultura. Muito já discorremos sobre como era a Pomerânia, seus campos, hábitos, costumes, geografia e tudo mais. No entanto, o que ainda podemos encontrar sobre a cultura dos ancestrais pomeranos nas antigas terras onde viviam?
Ainda existem as vilas de onde emigrou grande parte dos colonizadores de Pomerode? São perguntas que orbitam nossos pensamentos e despertam a curiosidade. Em nossa mente, prevalece uma visão estereotipada de que nossos ancestrais eram alemães com canecos de chopp na mão, com chapéu repleto de adereços e com calça de couro e suspensórios. Os pomeranos estão bem distantes dessa visão equivocada.
Era um povo intimamente conectado à terra e com um modo de viver na simplicidade. Alguns pomerodenses já tiveram o privilégio de retornar às vilas dos seus ancestrais, de se conectarem com lugares que fazem parte da história da família. Após a II guerra mundial, grande parte da antiga Pomerânia, foi transformado em território polonês e seus habitantes pomeranos desalojados pelo Exército Vermelho.
Os poloneses foram assentados nessas terras, ocupando as propriedades, trazendo seus hábitos e costumes. Assim, temos uma condição bastante peculiar na região da antiga Pomerânia. Um cenário com muitas construções como igrejas, casas e vilas com características típicamente pomeranas, mas com uma cultura atual decorrente da ocupação dos poloneses. O pomerodense Michel Gustmann e sua família foi até as antigas terras pomeranas para ver tudo isso de perto. Ele conta que sempre teve interesse em pesquisar e conhecer a história da sua família. E, na medida em que obteve mais informações sobre seus ancestrais provenientes da antiga Pomerânia, foi aumentando a sua vontade de visitar toda essa região. O sonho de viajar para a Polônia, se realizou em 2017, e com o apoio de um historiador local, teve a oportunidade de conhecer Naugard (Nowogard) e outros vilarejos de onde emigraram diversas famílias para Pomerode. Dois anos mais tarde, Michel retornou com sua família à Polônia, com intuito de aprofundar a pesquisa genealógica e conhecer novas localidades , estreitando os laços com pesquisadores locais. Em Naugard, eles visitaram diversos locais como cemitérios, praças, museus, biblioteca municipal, estação de trem e a prefeitura, tendo sido, inclusive, recebidos pelo prefeito da cidade (Robert Cazpla).
A visita contemplou a igreja da vila de Jarchlin (Jarchlino), a qual os trisavós do Michel frequentavam e onde inclusive se casaram poucos meses antes de emigrarem para o Brasil. Na vila de Külz (Kulice), a visita compreendeu a Casa Senhoril da família Bismark, a igreja e o cemitério local, tendo sido possível encontrar algumas lápides com sobrenomes de origem pomerana: “No cemitério de Külz encontramos algumas referências, como a lápide com sobrenome Gustmann, além de alguns outros sobrenomes de moradores de Pomerode, como Kühl, Reinke e Siewerdt.
Este foi o único cemitério onde encontramos essas lápides. Nos demais existem apenas lápides com menção dos que viveram nessa localidade cujos túmulos não existem mais”, destaca Michel.
O grupo ainda visitou outros vilarejos como Kniephof (Konarzewo), Regenwalde (Resko), Minten (Mietno), Gross Sabow (Zabowo), Klein Sabow (Zabówko) e Düsterbeck (Orzechowo).
Estar com os pés nas terras dos seus ancestrais certamente traz uma grande carga emocional. Michel relata que, ao estar lá 150 anos depois dos ancestrais terem deixado a região, o fez refletir muito sobre os fatores que motivaram a emigração, sobre as condições de vida, as necessidades desse povo, seus sonhos, e o quanto era duro e árduo o trabalho no campo: “o sentimento é de gratidão, pois, deixaram sua terra natal, atravessaram o Atlântico e chegaram em terras desconhecidas, mas, com um sonho de prosperar”, complementa Michel.
Ao descrever os locais que visitou, relata que encontrou muita simplicidade e poucos traços germânicos preservados, abandono e ruínas de diversos casarões, e poucos moradores locais que ainda falassem a língua alemã ou pomerana. Por outro lado, Michel destaca que os historiadores locais mostraram-se surpresos ao saberem da existência de uma colônia de pomeranos no sul do Brasil, originada a partir dos assentamentos dos emigrantes da antiga Pomerânia.
Outro pomerodense que fez “o caminho de volta” para as terras dos ancestrais foi Cláudio Werling. Ele destaca que desde sempre gostou de pesquisa e do estudo da história da sua família. Lembra que esse interesse vinha desde a infância, quando muitas e muitas vezes, sentado na varanda, depois do almoço, ouvia as histórias de sua bisavó Emma Volkmann, dos seus avós paternos, Otfried e Luzzi Werling e dos seus avós maternos, Otto e Locady Gall. Todos eles também compartilhavam muitas informações, com as quais aprendeu e melhorou o conhecimento da língua pomerana (platt).
Com todo esse aporte de informações sobre a história familiar, os costumes, a língua, foi se desenvolvendo um grande interesse em conhecer a Alemanha e as terras da antiga Pomerânia. Desde jovem, essa procura foi apenas crescendo. Aos poucos, por incentivo da professora de língua alemã, Sra. Adelira Pranke Beskow, que lhe indicou o belo acervo da biblioteca municipal, passou a ler cada mais sobre a região. Assim, de forma surpreendente, foi também compreendendo que, após a Segunda Grande Guerra, boa parte das terras dos seus ancestrais tinham se consolidado como território Polonês.
Por fim, o estímulo que faltava para seguir ao encontro do continente europeu, chegou com o convite de amigos que residiam na Alemanha. Dessa forma, finalmente, em 2008, no começo da primavera europeia, Cláudio e seu pai Vilson lá estavam. A viagem contemplou conhecer a região da saxônia, bem como, a relevante capital Berlim. Cláudio destaca que o deslocamento na Alemanha compreendia a passagem pelo rio Oder (atualmente fronteira entre Alemanha e Polônia) e, no sentido interior/litoral a ida até a região litorânea de Wollin, seguindo para o balneário de Misdroy (Miedzyzdroje), ambas banhadas pelo Mar Báltico, isso já em território Polonês.
Cláudio ressalta: “como descendente pomerano, conhecer o Mar Báltico (Ostsee) foi um dos pontos altos e muito impactante, pois ele banha toda a costa da antiga Pomerânia e poder colocar meus pés naquela água gelada foi emocionante”
Continuação segue no próximo número
Caminho Pomerano: A Força das Mulheres na Preservação da Cultura
Neste momento, quando se comemora e busca-se fazer reflexões no Dia Internacional da Mulher, torna-se obrigatório registrar a dedicação de todas as mulheres que compõem a Associação Caminho dos Pomeranos, que é o maior trading turístico da história de São Lourenço do Sul.
A presença feminina na Associação supra se constitui atualmente de cerca de 60% das mulheres. São agricultoras, artesãs, professoras, profissionais de turismo e empresarias, que desenvolvem um trabalho de suma importância para a preservação de nossa história e cultura, enquanto geram renda. Na composição da atual diretoria os principais cargos são ocupados por mulheres, o que é uma demonstração inequívoca de liderança nas ações de turismo rural e cultural.
Portanto, nesta data, cabe destacar a dedicação de inúmeras mulheres que, com esforço e trabalho, como associadas e dirigentes da Associação Caminho dos Pomeranos promovem ações que tornam ainda mais visível o resgate cultural. Estas mulheres estão fazendo a diferença no desenvolvimento de nossa economia, expandindo o nicho de turismo colonial e, sobretudo, atuando na valorização da cultura do povo pomerano, um dos mais singulares, bravos e valorosos grupos étnicos que vieram para o Brasil.
Em breve, será lançado o livro “Noivas de Preto”, uma saga contra a força da tradição e da lei dos senhores. O livro apresenta uma das mais marcantes e evocativas histórias pomeranas, quando o vestido preto a par do que alguns diziam ser sinal de respeito, e, talvez assim o fosse considerado mais modernamente, mas na sua mais antiga essência era na Pomerânia, um instrumento de rebeldia e semente de uma verdadeira revolução feminina no silencioso e opressivo mundo europeu da Idade Média.
De modo, que neste Dia Internacional da Mulher o reconhecimento a todas as mulheres de diversas etnias que, constroem nosso município, em especial as aguerridas mulheres que, por seu trabalho, dão força e energia à Associação Caminhos dos Pomeranos e cujo engajamento se reflete no próprio desenvolvimento de São Lourenço do Sul.
*Jairo Scholl Costa é advogado e escritor.
**Colaboração de Rodrigo Seefeldt, condutor local e acadêmico em Desenvolvimento Rural (UFRGS)
Rodrigo Seefeldt
Condutor Local Caminho Pomerano
Acadêmico em Desenvolvimento Rural – UFRGS