Coluna Pomerana
A língua pomerana e a sustentabilidade da cultura local
Publicado em 13/03/2018 às 12:10
O pomerano é uma língua germânica, antigamente falada nas margens do Mar Báltico, na província da Pomerânia. Era uma das 36 províncias da Confederação Germânica e cada uma tinha liberdade linguística e uma cultura própria em consequência da língua. A língua é o coração da cultura e é ela que arrasta todas as outras manifestações culturais que fazem parte da identidade de um povo.
Fig. 1 – Pontões Capixabas – Espírito Santo
http://www.janeladohorizonte.com.br/2015/08/5-motivos-para-visitar-o-espirito-santo.html
Quer destruir um povo, destrua sua língua. Com a Unificação Alemã em 1871 o idioma comum (ou a família teuta de idiomas) foi critério ou fator para a unificação. Essa província passou a pertencer à Alemanha e, com o fim da II Guerra Mundial 70% teve que ser entregue à Polônia. Hoje o termo Pomerânia chega a integrar o nome oficial de 3 regiões da Polônia). A Alemanha ficou só com 30% do seu território. Com a aceleração da globalização, hoje cada vez menos falam o pomerano na Europa. No Espírito Santo ainda temos milhares de crianças com sete anos que só falam o pomerano.
Então a “Nova Pomerânia”, é brasileira. Hoje a língua só é usada em comunidades do Espírito Santo, Rondônia, Minas Gerais, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Língua presente no Brasil desde 1859 – há 159 anos, portanto – tem hoje, no Espírito Santo, um universo de aproximadamente 120 mil falantes. “Cooficializar uma língua significa que o município passa a ser oficialmente bilíngue, e que seus cidadãos podem construir suas vidas em duas línguas – a língua oficial da União, o português, mas também a língua cooficial da comunidade, neste caso o pomerano – usando-as na educação, nos eventos culturais e na sua relação com o Estado.” (Cf. Defourny, V. e Muller de Oliveira, G. – “Qual é a língua?”. O Globo. Rio de Janeiro, 30 de dezembro de 2008).
Fig 2 – Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Povos e Comunidades Tradicionais
https://www.google.com.br/searchq=Comiss%C3%A3o+Nacional+de+Desenvolvimento+Sustent%C3%A1vel+de+Povos+e+Comunidades+Tradicionais&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved=0ahUKEwjziMi3n6DZAhVBg5AKHcKdAG0Q_AUIDCgD&biw=1344&bih=711#imgrc=J6ZzOfJ3QOjnAM:
Os pomeranos possuem representação na Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Povos e Comunidades Tradicionais (Decreto 6.040 de 7 de fevereiro de 2007, do presidente Lula) através da Associação dos Moradores, Amigos e Proprietários dos Pontões de Pancas / APOP e da Associação Cultural Alemã do Espírito Santo / ACAES. O objetivo básico dessa Comissão Nacional, que tem 15 povos tradicionais com representação titular e suplente, e 15 órgãos do governo federal, também com representação dupla, é construir políticas para os povos tradicionais do nosso país. Hoje podemos perceber como essa politica influenciou diversos editais dos governos federal, estadual e municipal do nosso país. Muitos projetos e iniciativas pomeranas já foram contempladas por esses editais no Espírito Santo, por exemplo.
Fig. 3 – Cidade de Pancas – https://www.google.com.br/search?q=cidade+de+pancas
Consoante informação fornecida pelos pomeranos que participaram do I Encontro dos Povos e Comunidades Tradicionais do Espírito Santo, realizado entre os dias 23 e 25 de março de 2012 em Praia Formosa, Aracruz (ES), “atualmente a língua pomerana já tem uma escrita e nos municípios mais pomeranos do estado do Espírito Santo já tem aulas de Língua Pomerana através do programa Educação Escolar Pomerana-PROEPO.” (Cf. doc. distribuído no evento, intitulado “Pomerânia”.) As estimativas produzidas pelo autor, apresentadas no I Encontro, acerca daqueles que se auto-intitulam “pomeranos” no Espírito Santo, correspondem a mais de 156.000 pessoas, distribuídas pelos seguintes municípios: Santa Maria de Jetibá, Laranja da Terra, Vila Pavão, Domingos Martins, Pancas (Lajinha), Afonso Cláudio, Baixo Guandu, Itaguaçu, Itarana, Vila Valério, São Gabriel da Palha, Colatina, Marechal Floriano, São Roque do Canaã, Governador Lindenberg e região metropolitana de Vitória.
Nesta “Estimativa de Mapeamento dos Pomeranos”, o autor assinala também municípios de Minas Gerais, Rondônia, Santa Catarina e Rio Grande do Sul com o respectivo percentual dos que se autodesignam pomeranos face aos totais obtidos pelo recenseamento do IBGE de 2010. Mas é no Espírito Santo que estão as comunidades pomeranas mais tradicionais, e foi nesse estado que começou esse trabalho de resgatar e valorizar essa rica identidade histórica e cultural do tradicional povo pomerano em meados da década de 1980, com os pomeranos e pesquisadores Helmar Rölke, Jorge Kuster Jacob, Martim Boldt, Ismael Tressmann, Rodolfo Gaede, Erineu Foerte, José Carlos Heinemann, Ivan Seibel e Jorcy Foerste Jacob. Essas pesquisas publicadas viraram livros, filmes, eventos e projetos, especialmente em Santa Maria de Jetibá, Vila Pavão, Laranja da Terra, Pancas, Domingos Martins, Vila Valério, Afonso Cláudio, entre outros.
A emancipação política de Santa Maria (de Santa Leopoldina) e de Vila Pavão (de Nova Venécia) foi fundamental e trouxe uma emancipação cultural paralela de grande impacto local. A sensibilidade política dos dois primeiros prefeitos destes municípios foi determinante na história pomerana capixaba. O prefeito Helmar Potratz de Santa Maria de Jetibá, por exemplo, narrava os desfiles da Festa Pomerana na língua pomerana, e vários grupos folclóricos pomeranos surgiram no interior. A primeira enciclopédia pomerana no mundo surge em Santa Maria. Em Vila Pavão, por exemplo, formou-se uma banda musical que cantava e gravava na língua pomerana; até um programa na língua pomerana surgiu na rádio local; e um jornal pomerano. Depois tivemos a cooficialização e a introdução do ensino da língua em 5 municípios do Espírito Santo. Pena que muitas administrações não dão a devida continuidade.
Fig. 4 – Língua cooficial – https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_cooficial
Investir na cultura local é ter projetos para as diversas manifestações tradicionais locais que o nosso povo tem e assim construir um projeto com recheio para o verdadeiro desenvolvimento econômico, local e sustentável.
Investir na tradicional cultura local é levantar a autoestima do nosso povo usando suas diversas manifestações populares (língua, culinária, dança, música, arquitetura, artesanato, moda, agricultura familiar, entre outras) para construir nosso turismo, nossa economia, nossa cultura, nossa comunidade, num amplo projeto de sustentabilidade.