POMERANA

Coluna Pomerana

A “CREDIBILIDADE” DA LÍNGUA POMERANA

Publicado em 02/09/2021 às 08:57

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Os pomeranos brasileiros estão passando por um processo em que discutem a legitimidade da língua e da escrita pomerana. Atualmente, parece existir certa polarização entre os pomeranos do Norte e Sul, isto é, do Espírito Santo e Minas Gerais e de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul.

Se traçarmos um paralelo entre a língua portuguesa falada em Portugal, em Angola e no Brasil, facilmente podemos constatar que as pronúncias e o próprio vocabulário têm expressivas variantes.

Se comparamos, por exemplo, um texto do escritor português Eça de Queiroz com os textos de Machado de Assis, facilmente veremos que há diferenças. Agora, se confrontarmos qualquer livro editado nos últimos anos em Portugal com outros contemporâneos publicados no Brasil, veremos que essa diferença é ainda significativa.

Para uma melhor contextualização, voltemos um pouco para a nossa própria história da imigração. Se queremos sair dessa polarização, se queremos sair desse microrregionalismo em que os pomeranos brasileiros se encontram, precisamos ampliar nossos horizontes. É preciso lembrar que no Brasil, no que se refere à língua pomerana, foram feitos registros diferentes entre as principais regiões de colonização desse povo. Isso levou ao desenvolvimento de um vocabulário típico regional, ou seja, expressões populares passaram a ser adotadas em situações linguísticas distintas. Além disso, em casa se falava o Pomerisch.

Os ofícios religiosos, o ensino confirmatório e os todas as tratativas com o pastor eram feitas em língua alemã (Hochdeutsch), enquanto que os contatos com as autoridades exigiam um conhecimento da língua portuguesa. Isso levou ao desenvolvimento de vocabulários típicos regionais, ou seja, expressões populares distintas passaram a ser em situações semelhantes. Não podemos esquecer que a utilização da língua pomerana, originária da Europa, já chegou com suas variantes, contribuiu para que os imigrantes assentados no Brasil mantivessem uma diversidade linguística, a qual nos dias atuais também está contribuindo para essa acirrada discussão em torno da própria legitimidade da escrita pomerana. Mas, voltemos para a língua pomerana. Uma das obras mais antigas editadas neste idioma, a Bíblia de Barth, com seus quase 450 anos de idade, comparável à obra “Lusíadas”, de Camões, marcou época. Com o passar dos anos e, por influência cada vez maior do Hochdeutsch em toda a região da Pomerânia, o Pomerisch escrito caiu em desuso. Voltemos ao título acima: o que significa credibilidade da língua pomerana?

Ter credibilidade significa não estar sozinho. Ter credibilidade significa trabalhar em equipe. Os pomeranos brasileiros estão passando por um processo em que discutem a legitimidade da escrita e da língua pomerana. O que seria legitimidade? Pelo significado da palavra seria o que está de acordo com a razão, com a justiça e com a lei.

Vejamos: vale dizer que quase estamos frente a uma nova realidade. Se o Dr. Tressmann elaborou uma obra fantástica em cima de uma determinada corrente linguística por ele considerada adequada, outros, do Rio Grande do Sul defendem variantes de um vocabulário decorrente de usos e costumes locais, não significa que esta ou aquela opinião possa estar MAIS correta.

Isto significa que O FALAR POMERANO tem MÚLTIPLAS PROCEDÊNCIAS em virtude do regionalismo, assim como já o tinha dentro da própria Pomerânia. Da mesma forma, como também podemos dizer que já existem palavras diferentes com o mesmo significado, com uso diferente em localidades diferentes. Se no Brasil queremos nos APROXIMAR a CERTA UNIFORMIDADE LINGUÍSTICA, precisamos criar novas formas para discutir as mudanças desta língua, já tão antiga e, ao mesmo tempo, para os conceitos nacionais brasileiros, tão nova.

Temos também que considerar que os imigrantes que aqui foram assentados, estavam destinados ao trabalho no campo. A falta de uma política pública de assistência para os recém chegados, fez com que durante muitas décadas

ficassem retidos aos seus pequenos espaços no campo. Na maioria dos relatórios oficiais se destaca a referência às grandes distancias dos assentamentos até os centros urbanos. A própria baixa densidade populacional dos primeiros tempos da colonização e a falta de perspectivas econômicas contribuíram em muito para a manutenção desse importante isolamento geográfico dos imigrantes pomeranos. Se hoje queremos que a cultura pomerana como um todo, tenha credibilidade, se queremos que seja respeitada como símbolo de um grupo étnico, devemos trabalhar e cultivar seus valores. Entre esses seus valores está a sua língua.

Para que isso possa acontecer, precisamos de muito diálogo e de negociações, que viabilizem o ensino da língua nas escolas, que possam patrocinar a elaboração de material escolar de boa qualidade e que possam contribuir para que O FALAR POMERANO, CADA VEZ MAIS DEIXE DE SER TRATADO COMO UM DIALETO E CADA VEZ MAIS SE TRANSFORME EM UMA LÍNGUA VIVA, FALADA E ESCRITA, PRÓPRIA DE UM GRUPO ÉTNICO DEFINIDO.

Apenas dessa forma poderemos falar em credibilidade do falar pomerano como língua do povo tradicional pomerano. As considerações do Dr. Ivan são interessantes. Observo, entretanto, que as diversas grafias do Pomerano no Brasil, que na verdade surgiram DEPOIS da edição do meu dicionário, em 2006, NÃO são oriundas em função dos regionalismos linguísticos entre ES e RS, etc. Do ponto de vista linguístico, ou seja, da Ciência da Linguagem, a língua pomerana falada no Brasil é uma só, com as variantes regionais. Estas variantes não interferem na mútua compreensão da língua, assim como um gaúcho entende perfeitamente o Português falado por um mineiro, um carioca, um amazonense.

Além da pronúncia das palavras, mutuamente intercompreensíveis, há diferenças no modo de nomear certas plantas, frutas, afora as gírias e termos familiares. Mas isso não desqualifica nenhum falar do Português do Brasil, ao contrário, deixa-o mais rico.

Enfim, as tentativas de escrita do Pomerano pós 2006 são de ordem ideológica e de compreensão de como uma língua está estruturada. Em primeiro lugar, a proposta criada no RS é do Summer Institut of Linguistics (SIL), entidade que atuou e atua entre os indígenas da América do Sul com o único e exclusivo fim de traduzir o Novo Testamento para as línguas autóctenes. Ou seja, é uma entidade exclusivamente religiosa, e que foi expulsa do Museu Nacional, UFRJ na década de 1970 após linguistas e antropólogos verificarem que não se tratava de uma entidade séria, científica.

Foi com este objetivo que o SIL, com a ajuda de pomeranos gaúchos, criou uma grafia paralela para o Pomerano, como mencionado acima, após a edição do meu dicionário. Inclusive a chefe desta empreitada nem é pomerana, mas uma linguista alemã que trabalhou grande parte de sua vida traduzindo o NT para a língua Kaingang.

A grafia do SIL foi prontamente descartada pelas professoras de Língua Pomerana do ES e pelos linguistas alemães, pois ela não espelha nem de longe as características das ortografias das línguas germânicas, como o Neerlandês, Sueco, Alemão, Inglês.

A outra tentativa de escrita que conheço está registrada na página de um Jornal de outra região do sul do Brasil. Ela mistura a proposta da minha ortografia, com o uso do A anelado (å), com a grafia da língua alemã. No entanto, esta grafia é bastante inconsistente, pois não está baseada em estudos científicos da língua pomerana.

Enfim, toda língua tem regionalismos, variantes locais, mas há algo que lhe é comum: a gramática. Isto eu observo como linguista, quando viajo para o RS, SC, e quando morei em RO. A gramática é a mesma, o que muda são os termos locais, são prontamente assimilados pelo falante nativo, após alguns dias de visita nas comunidades pomeranas em território brasileiro. Deste modo, as tentativas de escrever o Pomerano pós 2006 não se fundam no modo próprio de falar de cada estado brasileiro, pois a gramática da língua pomerana é a mesma em todas regiões.

As razões são outras…

Ninguém melhor do que o falecido jornalista teuto-pomerano Klaus Granzow para atestar isso!

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