Tradição do “Bom Princípio” não deve ocorrer em Araguaya devido à Covid-19
Publicado em 31/12/2020 às 13:01
Em todo dia 1º do ano, a manhã na vila de Araguaya, em Marechal Floriano, é movimentada com grupos de crianças percorrendo ruas, nas primeiras horas do dia. Com suas sacolas de doces, batendo de porta em porta, elas desejam o bom princípio de ano novo. Em retribuição, as famílias oferecem aos pequenos algumas balas, bombons e até um “dinheirinho”.
Porém devido à pandemia da Covid-19, alguns moradores do distrito estão sugerindo que a tradição não aconteça nesta sexta-feira (1º) visando a segurança da saúde das crianças e dos moradores que as recebem. Será a primeira vez na história da vila de Araguaya que a tradição centenária não deve ocorrer.
Morador da vila, o empresário Ademir Dadalto explicou que a sugestão visa a segurança e saúde das famílias. “Devido à pandemia, estamos pedindo para evitar as crianças saírem de casa e também as mães que acompanham os filhos. Por isso, estamos sugerindo cancelar, este ano, essa importante tradição de muito tempo. É a primeira vez na história de Araguaya que a gente pede que as crianças não saiam para fazer o bom princípio”, explicou Ademir.
Assim como boa parte dos moradores de Araguaya, Suiana Boldrini Mattedi participou da tradição quando criança e hoje leva o filho, o pequeno Luis Jerônimo Boldrini Mattedi, de três anos, para vivenciar e dar continuidade ao gesto. Porém, devido à pandemia, a mãe entende que para este ano o mais seguro é que as famílias permaneçam em casa.
“O Bom Princípio é uma tradição linda, que poucos lugares ainda o mantém. É preciso manter e resgatar essas tradições. Mas, estamos passando por um momento muito delicado, o índice de contaminação está altíssimo, pessoas perdendo seus entes queridos. O momento agora é de ficarmos em casa, respeitando o distanciamento e no próximo ano, voltamos com essa tradição linda, que não deve acabar!”, conta a mãe de Luis Jerônimo.
Além de levar o filho para as visitas no primeiro dia do ano, Suiana prepara cerca de 100 sacolinhas de doces para oferecer às crianças que passam por sua casa e, também, ajuda a sua mãe na preparação de outras 100 embalagens para presentear os jovens em outro ponto da vila.
TRADIÇÃO CENTENÁRIA – A tradição do “Bom Princípio” em Araguaya remete a uma prática de mais de 100 anos, quando a maior parte da população da vila era composta por imigrantes italianos e seus descendentes. O gesto, até hoje mantido, é o mesmo que no passado. Logo ao amanhecer, as crianças saem pelas ruas da vila, chegam às casas e desejam o “bom princípio” ou o “feliz ano novo”. Em retribuição, recebem balas e até mesmo moedas e cédulas de pequena quantia.
Lindaura Pilon Guidi, 83 anos, mora em Araguaya há mais de 50 anos. Ela conheceu o costume do “bom principio” na localidade de Iriritimirim (Alfredo Chaves), onde nasceu. “Lembro do bom princípio desde que eu me entendo como gente, bem pequeninha, quando eu estava no colo da minha mãe. Antigamente, era como hoje, as crianças indo de casa em casa. Naquela época ganhávamos bala, e mais era dinheiro, 200 réis, uns tostão…”, lembrou a moradora.
Depois que se casou, Lindaura mudou-se para a Vila de Araguaya, onde a tradição também ocorria. “Faz 51 anos que estou em Araguaya e sempre teve o bom princípio aqui também. Sempre abri as portas para as crianças. Acho bonita essa tradição. Dou balas e também dinheiro. As crianças gostam mais do dinheiro”, completou.
Os filhos de dona Lindaura participaram quando jovens e, hoje, a tradição na família é seguida pelos netos. Segundo a moradora, o gesto de dar uma pequena quantia de dinheiro, representa a prosperidade de conseguir o suficiente durante o ano e poder distribuir uma quantia simbólica para as crianças no primeiro dia do ano.