Embrapa lança a primeira cultivar de maracujá-doce
Publicado em 17/12/2017 às 10:15
Produtores, extensionistas, técnicos e estudantes participaram, nessa quarta-feira (13), na Embrapa Cerrados (Planaltina, DF), do lançamento da primeira cultivar da espécie Passiflora alata Curtis, maracujá-doce BRS Mel do Cerrado (BRS MC) registrada e protegida no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. A cultivar é uma nova opção para os fruticultores, tanto para os tecnificados que utilizam o cultivo em estufas, como para os pequenos produtores e agricultores urbanos e periurbanos. Com flor de cor exuberante (vermelho arroxeada), a cultivar é indicada para uso na fruticultura ornamental, com utilização das flores, frutos e da própria planta no paisagismo de grandes áreas como cercas e pérgulas.
A abertura do evento de lançamento, que contou com apoio da Agrocinco e Emater-DF, foi feita pelo chefe-geral da Embrapa Cerrados Cláudio Karia e pelo assessor de gabinete da Secretaria de Agricultura do DF, Aloísio Martins, representando o secretário de Agricultura do DF, Argileu Martins da Silva. Aloísio Martins destacou a importância do novo material para o produtor rural. “Mais uma vez a Embrapa nos entrega um produto que irá contribuir para o aumento da renda do produtor e fortalecer a cadeia produtiva do maracujá. Expresso aqui, em nome da secretaria de Agricultura do DF, nosso reconhecimento e agradecimento à Embrapa”, afirmou.
O chefe-geral da Embrapa Cerrados ressaltou o esforço da empresa em disponibilizar tecnologias para atender à demanda da sociedade e sua importância social. “A nossa missão é viabilizar soluções tecnológicas para a sustentabilidade da agricultura. A empresa não está aqui para ganhar dinheiro, mas para beneficiar a sociedade. A agricultura é importante para a sociedade brasileira e o país precisa ter uma empresa pública que responda aos interesses sociais e econômicos do país e que não tenha o foco em gerar lucro para si”, declarou Karia.
Melhoramento genético – as principais características da cultivar BRS Mel do Cerrado – alta produtividade, qualidade física e química dos frutos e maior nível de resistência a pragas e doenças – foram trabalhadas no programa de melhoramento genético da Embrapa. O pesquisador Nilton Junqueira explicou que em 1996, com o objetivo de desenvolver cultivares mais resistentes a doenças como virose e bacteriose foi montada na Embrapa Cerrados uma coleção de genótipos de maracujá procedentes da Amazônia Ocidental, Cerrados e Mata Atlântica do Nordeste, Sudeste e Sul.
“Em 1996 a virose e a bacteriose destruíram os plantios de maracujá em São Paulo e mais tarde no DF e Goiás. A cultura foi praticamente abandonada, reduzindo a pequenas áreas em estufas e a campo nos estados de Santa Catarina e Paraná, onde estas doenças não haviam chegado. Após montarmos a coleção, os genótipos selecionados foram enviados para Rio de Janeiro, Santa Catarina, São Paulo e Minas Gerais. O BRS Mel do Cerrado foi um dos genótipos desenvolvidos a partir desta coleção”, afirmou Junqueira, que foi o pioneiro dessas pesquisas na década de 1990.
A cultivar melhorada pelo melhoramento genético apresenta maior nível de tolerância às principais doenças foliares que a população original de melhoramento, entretanto ainda apresenta suscetibilidade à bacteriose e à virose. Para conviver com a virose, o pesquisador Nilton Junqueira recomenda o uso da tecnologia do “mudão”, onde as mudas são conduzidas em ambiente protegido até atingirem mais de 1,5 metros, quando então são levadas para o campo.
As principais vantagens do “mudão” são a menor perda de mudas em campo após o plantio; maior tolerância ao ataque de virose, podridão de raízes, cupins, fungos e bactérias; maior durabilidade do plantio e maior produtividade. Essas vantagens, de acordo com Junqueira, compensam o preço do “mudão” que é o dobro da muda convencional, o custo do transporte que é mais caro e mais complicado e a exigência de maior espaço dentro da estufa e do telado.
Outra orientação para os produtores de maracujá-doce conviverem com a bacteriose são as pulverizações preventivas, principalmente feitas no início das chuvas e durante as épocas do ano mais úmidas e quentes. Para minimizar os problemas enfrentados com os insetos, como mosca da fruta, besouro da flor, percevejos e tripés, o pesquisador recomenda fazer o manejo de pragas do mesmo modo que é feito com o maracujá-azedo.
Cultivo e produção – o sistema de produção da cultivar BRS Mel do Cerrado segue as recomendações técnicas do maracujazeiro-azedo comercial, com relação às exigências edafo-climáticas, preparo e correção do solo, necessidade de espaldeiramento, podas, irrigação e adubações. A partir das informações obtidas nas unidades de validação da cultivar e áreas experimentais, os pesquisadores fizeram alguns ajustes no sistema de produção que devem ser realizados com base na realidade local do produtor.
O plantio de maracujá-doce pode ser feito de duas formas: espaldeira ou latada. A pesquisadora Ana Maria Costa apresentou resultados em que foram comparados os dois sistemas de plantio. O maracujá-doce no sistema latada foi 87% mais produtivo que em espaldeira. A vantagem do sistema de espaldeira é poder aproveitar a área para cultivos consorciados, como por exemplo, com as culturas de arroz, feijão, amendoim e maxixe.
“Os resultados de produtividade foram melhores em latada, mas isso não quer dizer que todos os produtores devem usar esse sistema. A tomada de decisão deve ser pela mão-de-obra. Como os tratos culturais são mais difíceis na latada, o produtor deve decidir se vale a pena ou não fazer o cultivo em latada. Se ele não tiver mão-de-obra para fazer os tratos culturais é preferível a espaldeira, mesmo com menor produtividade”, disse a pesquisadora.
A principal recomendação para o momento do plantio, como frisou o pesquisador Fábio Faleiro, é o uso de sementes e mudas certificadas. “O produtor não deve economizar nessa hora. A qualidade da semente ou da muda é a base para garantir a produtividade do maracujazeiro”, afirmou Faleiro.
O uso de sementes de pomares anteriores – recurso comumente utilizado pelo produtor – gera a endogamia (união entre indivíduos aparentados, geneticamente semelhantes) que provoca perda de vigor da planta, menor vingamento de frutos, menor enchimento de frutos, desuniformidade do pomar, maior suscetibilidade a doenças e maior desuniformidade dos frutos.
Para o produtor de Brazlândia (DF) Mauro César, a grande vantagem no cultivo da BRS Mel do Cerrado é o período de polinização que não coincide com o do maracujá-azedo. “A polinização do doce ocorre pela manhã e a floração do azedo é pela tarde. Então isso casou e deu a oportunidade do meu funcionário trabalhar com os dois maracujás. Outra coisa é que produzo maracujá o tempo todo, aumentando minha receita, principalmente por que o preço do doce é quatro vezes mais que do azedo”, disse o produtor que pretende aumentar o número de estufas com cultivo do maracujá-doce à medida que for abrindo mercado.
Aproveitamento integral – paralelo ao programa de melhoramento genético do maracujazeiro são desenvolvidas tecnologias para produção e agregação de valor aos maracujás do Cerrado. A pesquisadora Ana Maria Costa explicou que para todos os elos da cadeia produtiva são estudadas maneiras de aproveitamento e agregação de valor ao maracujá-doce.
Do maracujá BRS Mel do Cerrado se aproveita as folhas, a polpa, sementes e a casca do fruto. A polpa tem menos acidez que o maracujá-silvestre e por isso come-se in natura. Cerca de 80% do fruto, que tem peso variando de 120 a 300 gramas, é formado pela casca, que também é comestível. A casca pode ser utilizada para fazer farinha, saladas e doce em compotas, entre outras receitas.
As indústrias de medicamentos e de cosméticos têm interesse pelas folhas do maracujá-doce. “A Passiflora alata, conhecida também como maracujina ou maracujá-doce, já é conhecida das indústrias que utilizam suas folhas para a fabricação de medicamentos, fitoterápicos e cosméticos. As folhas são ricas em antioxidante e flavonoides. O óleo extraído das sementes é utilizado na produção de cosméticos”, afirma a pesquisadora Ana Maria.
É justamente nesses múltiplos usos do maracujá que está apostando o produtor Luiz Carlos Cotta. “No início vou comercializar o maracujá em embalagens com 10 ou 12 unidades e depois espero abrir mercado para atender os interessados em aproveitar o produto. Na próxima safra, vou abrir área para plantar mais desse maracujá para ter mais essa opção de renda na propriedade”, disse Cotta, um dos produtores que validou o material em sua propriedade em Sobradinho, no DF. Os produtores interessados em plantar a cultivar BRS Mel do Cerrado já podem fazer a reserva de mudas com os viveiristas licenciados pela Embrapa. O contato desses viveiristas pode ser obtido em https://www.embrapa.br/busca-de-solucoes-tecnologicas/-/produto-servico/4126/maracuja-doce—brs-mel-do-cerrado-brs-mc.
Do melhoramento genético ao produtor
O pesquisador da Embrapa Cerrados Fábio Faleiro apresentou, durante o lançamento da cultivar de maracujá-doce BRS Mel do Cerrado, o programa de melhoramento genético do maracujazeiro e listou os produtos já desenvolvidos pela pesquisa. A fase de pós-melhoramento até a disponibilização dos materiais aos produtores foi abordada pelo gerente do escritório de Brasília da Embrapa Produtos e Mercado Isaac de Almeida.
Das 500 espécies conhecidas de maracujá cerca de 200 são encontradas no Brasil, sendo que 70 espécies dão frutos comestíveis. O melhoramento genético tem o objetivo de desenvolver cultivares nas linhas de maracujazeiro-azedo, doce, ornamental e espécies silvestres. “Fazemos cruzamentos com combinação de características de interesse. Nossos trabalhos vão desde a caracterização dos maracujás silvestres até a transferência de tecnologias. Para isso contamos com várias parcerias na rede de pesquisa”, ressaltou Faleiro.
Para desenvolver a cultivar BRS Mel do Cerrado, os primeiros ciclos de seleção e recombinação foram realizados em 1999, utilizando acessos e populações de Passiflora alata Curtis de diferentes origens. Faleiro explicou que o melhoramento genético populacional foi obtido por meio da seleção recorrente massal entre e dentro de família de meios irmãos. Matrizes e progênies superiores foram selecionadas e utilizadas na geração da nova cultivar.
Mais de 90% dos pomares de maracujá no Brasil são de maracujazeiro-azedo (espécie Passiflora edulis Sims). Dentro do programa de melhoramento genético do maracujazeiro-azedo, foram desenvolvidas e estão disponíveis para os produtores as cultivares BRS Gigante Amarelo, BRS Sol do Cerrado e BRS Rubi do Cerrado.
Novas espécies de maracujá estão conquistando o mercado, como a espécies de maracujazeiro-silvestre Passiflora setacea. O lançamento da cultivar BRS Pérola do Cerrado (BRS PC) em 2013 pelo programa de melhoramento genético contribuiu para o fortalecimento da cadeia produtiva desta espécie.
Das últimas cultivares lançadas, Faleiro destacou a BRS Sertão Forte (BRS SF) da espécie Passiflora cincinnata desenvolvida sob a liderança do pesquisador Francisco Pinheiro de Araújo da Embrapa Semiárido. Esta cultivar é indicada para cultivo no semiárido e também no Cerrado.
Fábio Faleiro também adiantou que estão em desenvolvimento outras variedades de maracujá-silvestre da série fruta e série minimaracujás, além de maracujazeiros-ornamentais e cultivares de porta-enxertos.
“A expectativa é que as cultivares desenvolvidas das diferentes espécies de maracujá possam diversificar os sistemas de produção gerando novas opções de geração de emprego e renda, melhorando a qualidade de vida dos produtores e proporcionando aos consumidores produtos derivados de uma biodiversidade essencialmente brasileira”, ressaltou Faleiro.
Mercado – o gerente do escritório de Brasília da Embrapa Produtos e Mercado Isaac de Almeida explicou como as novas cultivares chegam ao mercado. Depois que os materiais são selecionados pela equipe de pesquisa, eles vão para os ensaios nacionais para definir qual desses materiais será lançado pela Embrapa. No caso da BRS Mel do Cerrado, a cultivar foi testada em 16 pontos de validação em 13 unidades federativas do país.
Com as informações obtidas até o momento, a cultivar de maracujazeiro-doce BRS Mel do Cerrado tem sido indicada para cultivo no Cerrado do Planalto Central. A expectativa é ampliar as áreas de recomendação com base nas experiências de sucesso da cultivar nos diferentes pontos de validação em todas as regiões do Brasil.
Após a decisão sobre a cultivar a ser lançada é feito o plano de posicionamento. Isaac de Almeida explicou que neste plano é feita a comparação com concorrentes, verificada a viabilidade de lançamento, definição do modelo de negócio, o planejamento das atividades de divulgação e marketing e o atendimento à legislação. Com o lançamento do produto, ocorre a inscrição no mercado e disponibilizadas sementes/mudas para viveiristas licenciados pela Embrapa. A partir daí a comercialização é feita ao produtor pela iniciativa privada.
Os modelos de desenvolvimento de parceria público privada também foram abordados por Isaac de Almeida. Ele disse que após o material genético chegar à Embrapa Produtos e Mercado são feitas as sementes genética/básica e selecionados os licenciados que multiplicarão as sementes ou mudas a serem comercializadas aos produtores. Há dois modelos para que o produto chegue ao mercado: licenciamento de viveiristas e licenciamento de produtores de sementes.
Para se tornar um viveirista e/ou produtor de sementes licenciado pela Embrapa, o interessado deve ficar atento, respectivamente, aos comunicados de oferta e edital de oferta pública, divulgados pela Embrapa. Mais informações em www.embrapa.br/produtos-e-mercado.
Mais informações sobre a cultivar BRS Mel do Cerrado, incluindo recomendações técnicas do cultivo, podem ser obtidas na página www.cpac.embrapa.br/lancamentomeldocerrado.